quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Da floresta para a merenda escolar: agricultura familiar oferece alternativas econômicas no Pará

Ações do Florestas de Valor, do Imaflora, têm ajudado pequenos agricultores a acessarem políticas públicas, incentivado a conservação da floresta e oferecido melhorias na alimentação escolar de Oriximiná

Por Bruno Bianchin Martim

A agricultura familiar tem ajudado a transformar o perfil econômico de Oriximiná, cidade do extremo Oeste paraense. Com o maior número de reservas de bauxita do Brasil, o município é conhecido pela sua relação de dependência ligada à extração da matéria-prima, utilizada nas indústrias de transformação e química. Nos últimos dois anos, entretanto, as ações do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), por meio do Florestas de Valor, têm ressignificado a economia local e dado novas alternativas às comunidades quilombolas e aldeias indígenas da região.

Desde 2016, alimentos como farinha de mandioca, banana, batata doce, quiabo e abacaxi foram incorporados à merenda escolar do município, injetando mais de R$ 360 mil na economia oriximinaense por meio do PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), que oferece alimentação escolar e ações de educação alimentar e nutricional a estudantes de todas as etapas da educação básica pública.

Os recursos alcançaram mais de 30 famílias de pequenos agricultores locais, em quatro territórios quilombolas e uma terra indígena. No total, mais de 20 mil alunos, das áreas rural e urbana, alimentam-se com os produtos da agricultura local, cultivados de forma sustentável. Oriximiná tem 21 escolas em territórios quilombolas e 11 em terras indígenas. Só nestas escolas, há mais de dois mil alunos.

As atividades do Imaflora na cidade começaram em 2010, ano em que foi realizado um curso de formação para professores de técnicas agrícolas das escolas quilombolas. Nos anos seguintes, foram formatadas parcerias, realizadas oficinas de capacitação e colocada em prática uma estratégia para inclusão de produtos da agricultura familiar na alimentação escolar. Em 2016, as conversas com atores públicos se intensificaram e foi realizada uma chamada pública, instrumento administrativo municipal, que selecionou produtos de agricultores locais para a merenda escolar.

“O objetivo foi romper gradativamente o fornecimento de alimentos processados e de baixo valor nutricional à educação local. Aos poucos, foram sendo substituídos itens da alimentação convencional, industrializados, por alimentos ricos em fontes de vitaminas e produzidos sem o uso de agrotóxicos. Com isso, contribuímos para a melhoria da alimentação escolar da cidade, entregando produtos que trazem a cultura amazônica em sua composição”, afirma Mateus Feitosa, assistente de projetos do Imaflora.

O Imaflora é uma organização brasileira, sem fins lucrativos, que trabalha desde 1995 para promover a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais, gerar benefícios sociais e reduzir os efeitos das mudanças climáticas. O Florestas de Valor, uma de suas iniciativas, conta com patrocínio da Petrobras e financiamento do BNDES / Fundo Amazônia, Gordon e Betty Moore Foundation e USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional).

Feitosa explica que o trabalho na região, logo de início, envolveu assistência técnica, construção de estratégias para a venda e escoamento dos produtos e conexão com agentes governamentais. Ele ressalta que, no entanto, nesses dois anos houve uma mudança importante na relação dos agricultores com a sua produção: os comunitários passaram a ocupar a posição de protagonistas na orientação dos seus trabalhos.

“No início chamávamos os agricultores para se reunir, conversar e organizar materiais, criando espaços de empoderamento, pois eles não sabiam muito bem como conduzir as negociações e o andamento dos projetos. Deu resultado e, hoje, são muito mais autônomos em relação às suas decisões e têm mais controle sobre a produção, relacionando-se diretamente com políticas públicas e atores do governo municipal”, acrescenta.

Este ano os agricultores familiares incorporaram dois novos produtos à alimentação escolar do município: o pão de castanha e o beiju de mandioca seco. Os alimentos são produzidos em uma unidade de beneficiamento, inaugurada em 2018. Antes de a produção ter início foram realizadas capacitações em parceria com o Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) e o Sindicato dos Produtores Rurais de Oriximiná. Nos próximos meses, os produtos também começarão a ser vendidos ao consumidor final em mercados locais.

De acordo com a assistente de projetos do Imaflora, Andressa Neves, outros grupos também têm se beneficiado com a produção de quilombolas e indígenas, como ribeirinhos e assentados. “Estabelecemos um canal de diálogo com agentes municipais e com a equipe técnica da Prefeitura de Oriximiná e, depois do acesso à primeira chamada pública, os agricultores familiares da cidade passaram a olhar de forma diferenciada para os seus recursos, investindo em rótulos, embalagens e novas ferramentas para produção. A demanda também aumentou e gerou uma nova cadeia para valorização dos produtos familiares, melhorando a alimentação e a qualidade de vida local”, destaca.

O Florestas de Valor fortalece as cadeias de produtos florestais não-madeireiros, dissemina a agroecologia para que as áreas protegidas e seu entorno contribuam para o desenvolvimento regional, proporcionando condições dignas às populações locais e conservação dos recursos naturais. Atua na conservação da floresta nas regiões da Calha Norte do Rio Amazonas, na Terra do Meio e no município de São Félix do Xingu, fomentando atividades produtivas e oportunizando a geração de renda na Amazônia Legal brasileira.


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