sexta-feira, 9 de agosto de 2013

A Nova Ruralidade




por Heidi Buzato

A agricultura e o mundo rural são temas importantes dentro dos governos, da sociedade e da academia, sendo uma área estratégica para o desenvolvimento do país. Refletir sobre as transformações que o mundo rural vem vivendo, torna-se assim, fundamental para promover o diálogo institucional, as ações governamentais e a produção de conhecimento. Ciente desse desafio, a UFSCar - Universidade Federal de São Carlos - promoveu um encontro internacional para debater o “mundo rural” e suas relações com o meio ambiente, trabalho e com a questão agrária. O seminário contou com a participação de vários especialistas das universidades brasileiras dos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Sul, São Paulo, de países como Argentina e Espanha, além de alunos de cursos de mestrado e doutorado dessas e de outras universidades.

Nova Ruralidade é um termo que se estabeleceu no meio acadêmico para redefinir o mundo rural na atualidade. Entender como se configura esse espaço e seus novos usos, quem são os novos atores existentes, quais as novas atividades econômicas, os novos serviços prestados, incluindo aí os serviços ambientais, as relações de trabalho, as questões fundiárias são fundamentais para entender como se configura essa nova ruralidade.

Um dos temas que ganhou destaque nas discussões e que compõe essa nova ruralidade é a relação existente entre campo e cidade, cujo debate envolve a concepção de que o campo se explica não apenas pelas atividades agrícolas ali existentes mas na sua relação com as cidades, num continuum que implica em relações sociais, econômicas, comerciais, culturais e políticas interdependentes. Essas relações vêm mudando na atualidade e provocando uma redefinição na importância dos ativos e dos atores desse espaço.

Outro tema de importância crucial dentro desse debate diz respeito à produção de alimentos, não apenas em relação à quantidade e qualidade mas em relação aos atores que exercem o controle sobre a produção. Nesse campo, foram abordados temas, como a agroecologia e as cadeias de comercialização, a perda da capacidade de regulação do Estado diante de novas dinâmicas de poder, identidade dos produtos, certificação etc.

Na questão ambiental o desafio se apresenta na relação entre a produção de alimentos e a conservação ambiental. A agricultura tem sido, muitas vezes, a responsável pelos efeitos nefastos de devastação dos recursos naturais, ao mesmo tempo em que o mundo rural é o guardião dos recursos naturais como a água, a biodiversidade e outros.

Além de questões econômicas e ambientais, a nova ruralidade também é composta por novas relações de trabalho. Como consequência dos processos de modernização da agricultura e de globalização de mercados que permeia esse novo mundo rural, observa-se que as transformações operadas no trabalho industrial  alcançaram as relações de trabalho no campo promovendo novas formas de exploração do trabalho promovidas pela aceleração do tempo de trabalho, mecanização, terceirização, flexibilização das relações de trabalho, mobilidade de populações (migrações interestaduais). No conjunto dessas transformações, permanecem os paradoxos de uma sociedade desigual com a brasileira onde observa-se por um lado, a existência de conquistas de direitos trabalhistas, previdenciários e outros para o trabalho no campo,  e por outro, a existência de formas de trabalho análogas à escravidão.

Por último, mas igualmente importante, o debate se trava também em relação à questão agrária. Por um lado, alguns estudiosos deslocam o foco da questão agrária para a produção de alimentos e a conservação ambiental, entendendo que a reforma agrária não é mais uma pauta importante da agenda governamental uma vez que a demanda por terra não é mais tão importante quanto a questão dos recursos necessários para viabilizar quem está na terra, enquanto outros entendem que a questão agrária é ainda um tema da maior importância, que determina a estrutura fundiária do país e é a base das desigualdades e da pobreza existente no campo.

O tema é bastante amplo e esse artigo não tem a intenção de esgotá-lo, mas de levantar as principais questões em debate na academia, nos governos e na sociedade. As questões debatidas possuem uma interface importante com os trabalhos realizados no Imaflora pois trazem uma reflexão sobre as novas configurações do espaço rural brasileiro, as transformações no uso de recursos naturais disponíveis e nas relações socioeconômicas existentes, apontando para a necessidade de entender os novos desafios existentes. As ações, programas e projetos realizados pelo Imaflora têm na sua base esse novo mundo rural em transformação, e entendê-lo melhor é fundamental para a realização de sua missão institucional.



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