Na próxima quarta-feira, dia 11 de setembro, é comemorado
o Dia do Cerrado. Porém, mais do que comemorar, é o momento de lançar luz para
as ameaças pela qual o bioma passa e para soluções que buscam sua restauração e
uso responsável. Segundo maior bioma do Brasil, ocupando 24% do território, nas
últimas décadas o Cerrado tem sido a principal área de expansão agropecuária e
foi o bioma que mais sofreu alterações, tendo perdido metade da sua cobertura
vegetal original.
Coautor do trabalho “A expansão da agricultura em
remanescentes de vegetação nativa do bioma cerrado”, o engenheiro agrônomo
Lisandro Inakake, coordenador de projetos na área de Clima e Cadeias
Agropecuárias do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e
Agrícola), afirma que os impactos para o bioma "são inúmeros e ainda há
muito a ser mensurado e qualificado. As alterações climáticas são um ponto
muito importante. O desmatamento no cerrado já atinge 50% do bioma e há sinais
de escassez de água para uso humano e para a manutenção das atividades
agropecuárias". Lisandro lembra que, das 12 bacias hidrográficas do
Brasil, oito possuem nascentes importantes no cerrado e abastecem grandes
centros. "A correlação entre a mudança do uso do solo e a disponibilidade
dos recursos hídricos está bem clara. Sem falar nas perdas para a
biodiversidade. Um terço da biodiversidade brasileira, sendo quase 50% de
espécies endêmicas, estão no cerrado", diz Lisandro.
Especulação imobiliária e grilagem de terras
Lisandro também destaca os interesses da especulação
imobiliária na região. "É importante ressaltar que existem dois negócios
nas fronteiras agrícolas: a atividade agropecuária e a imobiliária. No Matopiba
(área entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) há grandes
grupos, incluindo fundos de pensão e de investimentos estrangeiros, que
adquiriram terras na região. São casos em que não existe necessariamente a
intenção de produzir e, sim, de investir com a perspectiva de valorização da
terra". O pesquisador explica que o processo de especulação imobiliária
pode estar associado à grilagem de terras. "Isso provocou e ainda provoca
consequências negativas, como o uso irresponsável dos recursos naturais, a
expulsão das populações tradicionais do território de ocupação, contaminação de
rios com agrotóxicos e outros fatores derivados desses", elenca Lisandro.
Imaflora: soluções para a conservação e restauração do
Cerrado
Quando a Nespresso decidiu implementar um programa de
qualidade e sustentabilidade em sua cadeia de fornecedores, composta por 2000
fazendas localizadas na região do Cerrado e também no sul de Minas Gerais, a
empresa solicitou a assessoria técnica do Imaflora. O Instituto desenvolveu uma
ferramenta única para a iniciativa, adaptando para as condições brasileiras as
normas adotadas em fornecedores da América Central, onde o programa já tinha
sido implantado, seguindo orientações da Rainforest Alliance.
“Nosso trabalho consiste basicamente em fazer uma análise
minuciosa de riscos socioambientais de todos os elos da cadeia de suprimentos
no campo. Com esse mapeamento é possível traçar planos de ação de normas de
sustentabilidade que melhorem a performance socioambiental dos produtos”,
explica Eduardo Trevisan, gerente de projetos do Imaflora. Os técnicos
agrônomos que orientam os processos produtivos nas fazendas recebem treinamento
do Imaflora. “Em visitas frequentes às propriedades rurais, esses técnicos são
os agentes de rastreamento de cada etapa, da pré à pós-colheita”, explica
Trevisan.
Ao adotar a sustentabilidade na produção, melhorando a
qualidade dos grãos, os fornecedores que participam do programa recebem da
Nespresso um pagamento acima do preço padrão do mercado, o que facilita a
fidelização dos produtores ao programa. “Com nossa experiência queremos
incentivar as empresas a atingir suas metas de boas práticas e divulgar a
origem e a performance socioambiental de seus produtos”, afirma Trevisan.
O Imaflora também atua no Consórcio Cerrado das Águas,
uma plataforma que reúne diferentes atores (produtores, marcas de café, ONGs
ambientais locais e globais), cujos esforços resultaram na fundação de uma
organização independente para promover o desenvolvimento ambiental através da
restauração, da agricultura inteligente e da gestão eficiente de recursos
hídricos. Recentemente o Consórcio Cerrado das Águas lançou o Programa de
Investimento no Produtor Consciente, que visa conservar a biodiversidade e o
fornecimento de água na Região do Cerrado Mineiro. O projeto piloto está sendo
implementado na bacia do Córrego Feio, localizada no município de Patrocínio,
Minas Gerais, o principal produtor de café no Brasil.
Junto com o Consórcio Cerrado das Águas, o Imaflora
também produziu dois guias voltados para os produtores da região: o Guia deRestauração para o Cerrado Mineiro: Como Recuperar e Conservar sua Fauna e Flora; e Boas Práticas de Produção de Café: Serviços Ecossistêmicos e Serviços Ambientais.
Outra forma de atuação para a conservação e restauração
do Cerrado é o controle das emissões de gases do efeito estufa em produções
agrícolas. O Imaflora realizou o balanço das emissões de gases demonstrando das
fazendas de café da cooperativa Monteccer, localizada na região do município
de Monte Carmelo, em Minas Gerais, região do
Cerrado, referente à safra de 2017/2018. Segundo Ciniro Costa Júnior,
coordenador de projetos da área de Clima e Cadeias Agropecuárias do Imaflora, o
estudo apresentou as estimativas do balanço de emissões de gases de efeito
estufa (GEE) pela produção de café em escala de fazenda de 34 propriedades
da cooperativa.
As emissões de gases de efeito estufa das fazendas
analisadas apresentaram uma média de -2.4 tCO2e por hectare por ano, ou -0.06
tCO2e por saca produzida. Isso significa um alto nível de sequestro de gases de
efeito estufa. "Esse nível de intensidade de emissão por produto aponta
que a Cooperativa Monteccer se posiciona entre os 5% mais eficientes sistemas
de produção de café globalmente", aponta Ciniro. "O monitoramento
do balanço de emissões de gases de efeito estufa é recomendado para
fortalecer as evidências encontradas e identificar com maior precisão as
correlações entre o manejo do café e oportunidades de mitigação de gases
de efeito estufa, de forma a influenciar positivamente outros atores do setor
à incorporar práticas sustentáveis, ser reconhecido pelo mercado devido ao
papel desempenhado na prevenção das mudanças climáticas e no atendimento
às demandas alimentares", explica.
Conforme explica Oséias Mendes da Costa, coordenador de
projetos da área de Cadeias de Valor do Imaflora, os resultados se devem a
diversas práticas, algumas já praticadas, outras recomendadas pelo Imaflora,
como o uso de fertilizantes, o acompanhamento de um responsável técnico,
análises de solo e folhas, juntamente com um conjunto de práticas sustentáveis
na produção do café, envolvendo conservação do solo e de áreas vegetação
nativa. "Estas práticas podem ser replicadas por outros produtores e
cooperativas de café, impactando positivamente na conservação do cerrado",
conclui.
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