sexta-feira, 29 de março de 2013

De onde vem o seu chocolate: do coelho, da Amazônia ou da África?


Por Tharic Galuchi 
Fonte: Folha de São Paulo (29/03/2013)

Nesta Páscoa, ao comer um saboroso chocolate, poucos se perguntarão como foi produzido e onde foi cultivado.

O formato dos frutos de cacau, vistos na televisão, podem fazer uma criança acreditar que realmente o chocolate venha do ovo de páscoa trazido por um coelho. No entanto, nem mesmo adultos chocólatras acabam conhecendo a origem desse alimento, que um dia foi descrito como comida dos deuses. A distância entre áreas de produção de cacau e os grandes centros consumidores dificultam ainda mais conhecermos a realidade da cacauicultura.

O cultivo de cacau tem limitações climáticas, que obrigam sua produção a se localizar em áreas tropicais, preferencialmente úmidas, como é o caso do Sul da Bahia, região transamazônica do Pará, países da Costa África e Indonésia. Além do clima, as regiões produtoras têm grandes semelhanças como alta biodiversidade e baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).

Atualmente, a Costa do Marfim, Gana e Indonésia lideram o ranking dos países produtores e exportadores de cacau. Com uma dinâmica diferente, o Brasil, sexto maior produtor, tem uma indústria consolidada e mercado interno capaz de absorver toda produção interna, sendo o quinto consumidor mundial e um exportador sem relevância.

E a demanda, como todo Brics, é crescente, com o setor industrial de chocolates e balas avançando em taxas anuais próximas a 10%. Isso nos faz imaginar que os produtores brasileiros, devastados pela doença da vassoura de bruxa em suas lavouras, desde a década de 80, finalmente compartilharão dos benefícios do ótimo momento.

Pelo contrário, o setor produtivo atravessa um momento delicado, onde a baixa de preços está direcionando o cultivo para a inviabilidade econômica, chegando aos mais baixos preços já vistos no nosso país. O fenômeno pode ser melhor explicado por economistas, mas os produtores nacionais responsabilizam a queda pelo aumento nas importações brasileiras de cacau da Costa Africana, sem nenhuma garantia mínima de que foi produzido com responsabilidade socioambiental.

As principais empresas multinacionais do setor, Nestlé, Mars, Kraft Foods (atual Mondelez), Ferrero e Hersheys, já mostraram sua preocupação com a origem do chocolate que fabricam, comprometendo-se publicamente a adquirir 100% de cacau com garantias de sustentabilidade e certificação até 2020.

Gradativamente essas empresas oferecem novas opções de consumo na Europa e nos Estados Unidos, desde barras de chocolate até sorvetes identificados com selos verdes de certificação.

Mas a principal mudança dessas iniciativas está bem longe das prateleiras do supermercado: a melhoria de vida e conservação das florestas nas fazendas. Esse resultado está sendo observado no crescente número de produtores certificados com os selos Fair Trade, UTZ Certified e Rainforest Alliance Certified, a taxas superiores a 20% ao ano em 2011, principalmente na África.

Os compromissos das grandes corporações ainda não causaram impactos significativos no Brasil, havendo apenas iniciativas pioneiras e ousadas de produtores que vislumbram essa tendência e querem produzir seguindo conceitos de sustentabilidade.

As fazendas M.Libânio e Vale do Juliana, cravadas na Mata Atlântica, da tradicional região cacaueira do Sul da Bahia, são os exemplos de produtores certificados que temos no Brasil e que estão servindo de referência a produtores da Amazônia, no Pará, a nova fronteira do cacau e da certificação.

Tais iniciativas podem estar condenadas pela atual crise no setor, falta de mercado interno que reconheça esse diferencial e morosidade dos compromissos assumidos chegarem ao Brasil.

Mas nem tudo está perdido! Nesta Páscoa, a Harald, indústria nacional, nos deu uma opção e lançou no mercado nacional o primeiro chocolate, com fins culinários, com selo Rainforest Alliance Certified, uma garantia de origem que contribui para proteger a biodiversidade e a vida dos trabalhadores do cacau.
Tharic Galuchi, 30, engenheiro agrônomo, é coordenador de certificação do Imaflora. A ONG, representada por Luís Fernando Guedes Pinto, também engenheiro agrônomo, é integrante da Rede Folha de Empreendedores Socioambientais.

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