segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Certificação deve ser ambiciosa ao tratar da sustentabilidade

A opinião acima é de Luis Fernando Guedes Pinto, engenheiro agrônomo, que acaba de apresentar o estudo do IMAFLORA “Aprendizados da certificação socioambiental para agricultura”, no congresso da ISEAL Alliance, a principal aliança internacional para a construção de padrões de sustentabilidade, ocorrido em Genebra, na Suíça. Luis Fernando acompanha o tema na teoria, como pesquisador, e na prática, como gerente de certificação agrícola da ONG, que foi pioneira em trazer para o Brasil o selo Rainforest Alliance CertifiedTM, por meio da certificação de uma fazenda de café, em 2003.

Desde então, o assunto tem sido objeto de estudos, análises e debates com o objetivo de detectar seus limites e alcance, até como uma forma de monitorar os resultados da ferramenta, escolhida pela instituição, ao lado de outros mecanismos, para contribuir com a conservação dos recursos naturais e a geração de benefícios sociais no campo. Atualmente, com 500 empreendimentos  agropecuários certificados e uma quantidade enorme de trabalhos a respeito (todos disponíveis gratuitamente aqui) o IMAFLORA sistematiza e compartilha seu aprendizado. Luís Fernando esclarece que embora existam 210 padrões de códigos de conduta para os vários produtos, o seu trabalho do refere-se ao  aprendizado no desenvolvimento  e aplicação do padrão da Rede de Agricultura Sustentável, que utiliza o selo Rainforest Alliance Certified™ na identificação dos produtos certificados.

Há um recado principal desse trabalho? 

Luís Fernando Guedes Pinto - Entre os vários aprendizados da certificação, destacaria o fato de ter deixado de ser um “produto de nicho” e passar a ocupar o “mainstream”. Atualmente, a certificação é uma tendência, está na agenda das empresas, dos produtores, tanto no setor agrícola quanto no florestal. Outro estudo, também apresentado nesse congresso da ISEAL Alliance, "The State of Sustainable Markets 2017” traz dados sobre área, volume de produção e produtores dos 14 principais sistemas de certificação para café, chá, banana, cacau, algodão, óleo de palma, soja, cana e produtos florestais,  no qual essa tendência fica evidenciada.

Focando agora na certificação agrícola, quais as razões do crescimento e o que leva o produtor a procurar a certificação?

A primeira motivação é a possibilidade de ganhos econômicos maiores, por meio de prêmios para o produto ou do acesso a mercados diferenciados. No entanto, a grande surpresa para o produtor, captada pelo estudo, é  que o cumprimento dos critérios para a certificação levam a uma gestão mais eficiente do empreendimento, com aumento de produtividade, eficiência e diminuição dos custos de produção. Por isso, as fazendas certificadas tendem a ser mais lucrativas que as que não o são. Outro ponto interessante é que, diferente da suposição dos produtores antes de se certificarem, é de os custos das auditorias representam muito pouco para o empreendimento, não apareceram como uma barreira à certificação. Pelos cálculos que fizemos, no caso de uma fazenda de café, o custo relativo corresponderia a 0,28% por saca. A maior vantagem econômica pode estar dentro da fazenda, mas isso ainda é invisível para os produtores.

Essa constatação vale também para os pequenos produtores?

Os pequenos e médios produtores só chegam à certificação se estiverem organizados coletivamente, se possuírem alta produtividade e contarem com algum tipo de ajuda externa. Muitos deles recorreram ao Fundo Social, do Imaflora, para chegar lá. O Fundo Social está explicado no estudo  (página 7), mas trata-se de um mecanismo criado para diminuir a barreira econômica para os agricultores familiares e para os pequenos produtores.

 A inclusão ainda é um grande desafio a ser enfrentado?

Sem dúvida e foi um tema que ocupou muito das discussões da conferência da ISEAL. Um mecanismo como o que temos, o fundo, diminui a barreira econômica, mas não é inteiramente inclusivo. O buraco é mais embaixo e não se trata de um problema da certificação, é preciso que os produtores tenham apoio, assistência técnica.

E quais são os aprendizados no que se refere ao desempenho social dos empreendimentos certificados?  O estudo se refere à questão como um tabu.

O que verificamos é que as mudanças de desempenho das fazendas certificadas ocorrem em um processo de melhoria contínua, inclusive para as exigências legais, o que não é pouca coisa no campo. Há situações inadmissíveis para a certificação, identificadas como critérios críticos e que precisam ser corrigidas imediatamente. O tabu a que nos referimos se deve às falhas encontradas em empreendimentos certificados. Elas acontecem, mesmo em relação ao cumprimento legal. Se o desacordo com a norma acontecer em um desses critérios críticos, deve ser corrigido imediatamente. Mas, caso não recaia em alguns deles, há um prazo para que sejam corrigidos. O sistema prevê a possibilidade de falhas e prevê um mecanismo para saná-las. Apesar disso, os estudos confirmam que uma fazenda certificada com nota mínima (sim, porque embora certificadas, são diferentes entre si) ainda tem um desempenho socioambiental acima das não certificadas. É um processo de melhoria contínua, que embute a ideia de que quem é certificado não é perfeito, mas a correção das não conformidades leva o empreendimento a ganhos e isso é um processo natural. E para tudo isto funcionar é fundamental a transparência e a participação da sociedade nos sistemas de certificação e no monitoramento dos empreendimentos certificados e certificadores.

E para o futuro, quais são as tendências da certificação?

O futuro vai defender do impacto em escala no meio ambiente, da  sinergia com outras  ações públicas e privadas, como as moratórias transitórias e políticas ambientais e agrícolas, por exemplo.  A certificação tem um papel bem mais ambicioso, de induzir uma espiral de aumento de desempenho socioambiental mais amplo, induzir mudanças significativas e de desenvolver a inovação para a sustentabilidade da agropecuária.





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