A opinião acima é de Luis Fernando Guedes Pinto,
engenheiro agrônomo, que acaba de apresentar o estudo do IMAFLORA “Aprendizados da certificação socioambiental para agricultura”, no congresso da ISEAL
Alliance, a principal aliança internacional para a construção de padrões de
sustentabilidade, ocorrido em Genebra, na Suíça. Luis Fernando acompanha o tema
na teoria, como pesquisador, e na prática, como gerente de certificação
agrícola da ONG, que foi pioneira em trazer para o Brasil o selo Rainforest
Alliance CertifiedTM, por meio da certificação de uma fazenda de café, em 2003.
Desde então, o assunto tem sido objeto de estudos,
análises e debates com o objetivo de detectar seus limites e alcance, até como
uma forma de monitorar os resultados da ferramenta, escolhida pela instituição,
ao lado de outros mecanismos, para contribuir com a conservação dos recursos
naturais e a geração de benefícios sociais no campo. Atualmente, com 500
empreendimentos agropecuários certificados
e uma quantidade enorme de trabalhos a respeito (todos disponíveis
gratuitamente aqui) o IMAFLORA sistematiza
e compartilha seu aprendizado. Luís
Fernando esclarece que embora existam 210 padrões de códigos de conduta para os
vários produtos, o seu trabalho do refere-se ao
aprendizado no desenvolvimento e
aplicação do padrão da Rede de Agricultura Sustentável, que utiliza o selo
Rainforest Alliance Certified™ na identificação dos produtos certificados.
Há um recado principal desse trabalho?
Luís Fernando Guedes Pinto - Entre os vários aprendizados
da certificação, destacaria o fato de ter deixado de ser um “produto de nicho”
e passar a ocupar o “mainstream”. Atualmente, a certificação é uma
tendência, está na agenda das empresas, dos produtores, tanto no setor agrícola
quanto no florestal. Outro estudo, também apresentado nesse congresso da ISEAL
Alliance, "The State of Sustainable Markets 2017” traz dados sobre área, volume de produção e
produtores dos 14 principais sistemas de certificação para café, chá, banana,
cacau, algodão, óleo de palma, soja, cana e produtos florestais, no qual essa tendência fica evidenciada.
Focando agora na certificação agrícola, quais as razões
do crescimento e o que leva o produtor a procurar a certificação?
A primeira motivação é a possibilidade de ganhos
econômicos maiores, por meio de prêmios para o produto ou do acesso a mercados
diferenciados. No entanto, a grande surpresa para o produtor, captada pelo
estudo, é que o cumprimento dos
critérios para a certificação levam a uma gestão mais eficiente do
empreendimento, com aumento de produtividade, eficiência e diminuição dos
custos de produção. Por isso, as fazendas certificadas tendem a ser mais
lucrativas que as que não o são. Outro ponto interessante é que, diferente da
suposição dos produtores antes de se certificarem, é de os custos das
auditorias representam muito pouco para o empreendimento, não apareceram como uma barreira à certificação. Pelos
cálculos que fizemos, no caso de uma fazenda de café, o custo relativo
corresponderia a 0,28% por saca. A maior vantagem econômica pode estar dentro
da fazenda, mas isso ainda é invisível para os produtores.
Essa constatação vale também para os pequenos produtores?
Os pequenos e médios produtores só chegam à certificação
se estiverem organizados coletivamente, se possuírem alta produtividade e
contarem com algum tipo de ajuda externa. Muitos deles recorreram ao Fundo
Social, do Imaflora, para chegar lá. O Fundo Social está explicado no estudo (página 7), mas trata-se de um mecanismo
criado para diminuir a barreira econômica para os agricultores familiares e
para os pequenos produtores.
A inclusão ainda é
um grande desafio a ser enfrentado?
Sem dúvida e foi um tema que ocupou muito das discussões
da conferência da ISEAL. Um mecanismo como o que temos, o fundo, diminui a
barreira econômica, mas não é inteiramente inclusivo. O buraco é mais embaixo e
não se trata de um problema da certificação, é preciso que os produtores tenham
apoio, assistência técnica.
E quais são os aprendizados no que se refere ao
desempenho social dos empreendimentos certificados? O estudo se refere à questão como um tabu.
O que verificamos é que as mudanças de desempenho das
fazendas certificadas ocorrem em um processo de melhoria contínua, inclusive
para as exigências legais, o que não é pouca coisa no campo. Há situações
inadmissíveis para a certificação, identificadas como critérios críticos e que
precisam ser corrigidas imediatamente. O tabu a que nos referimos se deve às
falhas encontradas em empreendimentos certificados. Elas acontecem, mesmo em
relação ao cumprimento legal. Se o desacordo com a norma acontecer em um desses
critérios críticos, deve ser corrigido imediatamente. Mas, caso não recaia em
alguns deles, há um prazo para que sejam corrigidos. O sistema prevê a
possibilidade de falhas e prevê um mecanismo para saná-las. Apesar disso, os
estudos confirmam que uma fazenda certificada com nota mínima (sim, porque
embora certificadas, são diferentes entre si) ainda
tem um desempenho socioambiental acima das não certificadas. É um processo de
melhoria contínua, que embute a ideia de que quem é certificado não é perfeito,
mas a correção das não conformidades leva o empreendimento a ganhos e isso é um
processo natural. E para tudo isto funcionar é fundamental a transparência e a
participação da sociedade nos sistemas de certificação e no monitoramento dos
empreendimentos certificados e certificadores.
E para o futuro, quais são as tendências da certificação?
O futuro vai defender do impacto em escala no meio
ambiente, da sinergia com outras ações públicas e privadas, como as moratórias
transitórias e políticas ambientais e agrícolas, por exemplo. A certificação tem um papel bem mais
ambicioso, de induzir uma espiral de aumento de desempenho socioambiental mais
amplo, induzir mudanças significativas e de desenvolver a inovação para a
sustentabilidade da agropecuária.
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