Patrícia Cota Gomes e Luiz Brasi Filho.
Foto: Andre Giovani |
Existem aproximadamente 305 etnias indígenas no Brasil, que falam mais de 270 línguas, além de centenas de comunidades extrativistas e quilombolas que dependem diretamente das florestas e outros ecossistemas nativos para a sua sobrevivência.
Esses povos possuem relações intrínsecas com a floresta,
e seus sistemas tradicionais de manejo geralmente está associado ao uso de
múltiplos produtos, reduzindo a pressão sob espécies, além de serem realizados
em escala e intensidade com baixo impacto à floresta e sua biodiversidade.
Essas populações vêm ainda contribuindo, ao longo de
gerações com o processo de seleção e melhoramento vegetal, acumulando um vasto
conhecimento sobre manejo, reprodução e utilização dos ativos da biodiversidade
de forma sustentável. Alguns destes ativos são bastante conhecidos dentro e
fora do Brasil, e dependem diretamente da floresta em pé e da forma de vida e
manejo realizado por essas populações. É o caso da castanha do Brasil, produto
coletado manualmente pelos povos da floresta. E do açaí, que ganhou o mundo por
suas características antioxidantes, se firmando como um produto de grande
relevância econômica para os estados produtores do norte do país, como é o caso do Pará por exemplo. E há ainda muitos
outros, menos conhecidos como os óleos de copaíba e andiroba, utilizados
largamente na indústria de cosméticos: e a semente de cumaru, responsável pelo
aroma que se assemelha ao da baunilha, utilizado na alta gastronomia e também
na indústria de perfumaria. Esses são apenas alguns dos exemplos de como o
extrativismo destes produtos e manejados por estas populações contribuem no
desenvolvimento de uma nova economia que alia a geração de renda e conservação
florestal.
Contudo, consumidores no mundo todo praticamente
desconhecem a origem destes produtos florestais, bem como as formas de manejo e
coleta. Na maioria dos casos as cadeias de valor de produtos da floresta são
informais, com participação de diversos intermediários, que geralmente
remuneram muito mal os coletores. Esse desconhecimento e a ausência de
mecanismos de rastreabilidade, transparência e origem da produção, colocam
essas populações na escuridão, bem como suas histórias, formas de vida e manejo
que passam a não são ser reconhecidas e tampouco valorizadas pelos
consumidores.
Aliado a esse desafio, outro fator preocupante é o
aumento contínuo da pressão e desmatamento na Amazônia especialmente em terras
indígenas e Unidades de Conservação, ameaçando as populações tradicionais e
indígenas, seu modo de vida e a biodiversidade brasileira.
Então como conectar a população urbana com os povos da
floresta de forma a reconhecer e valorizar o papel fundamental desses povos
para a conservação da biodiversidade e manutenção da floresta em pé?
Por meio de iniciativas e redes multisetoriais como o
Origens Brasil, que é uma rede de
articulação (formada por populações tradicionais, povos indígenas, organizações
da sociedade civil, empresas e consumidores), lançada em 2016 pelo Imaflora e
ISA, que defende caminhos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia a
partir da valorização das atividades econômicas das populações tradicionais e
povos indígenas, suas culturas e modo de vida. Os pilares do Origens Brasil®
são a articulação em rede, tecnologia e comunicação - aproximando o produtor de
empresas e do mercado consumidor, que por meio de um qr- code, que é a própria
logomarca do Origens Brasil, provoca uma viagem do consumidor ao território de
origem do produto, as histórias dos coletores, sua culturas e muito mais. Uma
conexão necessária de quem compra e consome na cidade com quem produz e
conserva na floresta.
Neste ano o Origens Brasil recebeu o prêmio da FAO/ONU
como inovação para alimentação e agricultura sustentáveis, veja aqui. A iniciativa possui mais de 1.500
produtores membros, de 40 diferentes etnias indígenas, além de quilombolas e
extrativistas, em aproximadamente 90 milhões de hectares, comercializando de
forma ética com 15 empresas e impactando positivamente aproximadamente esses
produtores e suas famílias.
Esse é apenas um dos muitos exemplos de iniciativas na
Amazônia que tem o potencial de olhar de
forma estratégica para os povos da floresta e para nossa biodiversidade e
ajudar na construção de uma nova economia descarbonizada, mais inclusiva e
justa, que gera riqueza e conserva, ajudando a manter de pé um dos nossos
maiores patrimônios da humanidade, nossa Amazônia.
*Patrícia Cota Gomes – Engenheira florestal e mestre em
manejo de florestas tropicais. Gerente no Imaflora onde coordena a iniciativa
Origens Brasil®, que visa promover novos modelos de negócios na Amazônia,
fomentando a transparência e valorização no mercado de produtos de populações
tradicionais e povos indígenas.
** Luiz Brasi Filho – Gestor ambiental e MBA em gestão de
negócios socioambientais.
Coordenador de Mercado no Imaflora/Origens Brasil e que
visa promover novos modelos de negócios na Amazônia, fomentando a transparência
e valorização no mercado de produtos de populações tradicionais e povos
indígenas.
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